quarta-feira, 30 de março de 2011

Resgate de um herói

A História do Brasil registra feitos de muitos heróis. Heróis de guerras, heróis que morreram em defesa da liberdade do nosso país.
Contudo, ainda hoje, existem outros tantos heróis desconhecidos que nos merecem todas as honrarias.
É possível que poucos ou nenhum de nós tenha ouvido falar a respeito de Luiz Martins de Souza Dantas. Seu nome, em verdade, não figura em nenhum livro-texto de História do Brasil.
Descendente de uma das mais ilustres famílias do Império, após seguir uma apreciável carreira política, por vários anos, dentro e fora do Brasil, foi nomeado Embaixador na França.
Apreciador das artes, da música, é descrito como uma alma nobre e generosa.
Anfitrião impecável dos brasileiros em Paris, era também um grande filantropo, disposto a ajudar todos os que passaram por sua vida.
Diplomata experiente, dotado de grande inteligência e perspicácia, Dantas circulava entre os mais altos e restritos círculos diplomáticos.
Cedo compreendeu a catástrofe, prestes a se abater sobre a Humanidade, com a ascensão do nazismo.
Dizia ser aquela uma época de trevas e de barbáries.
Quando eclodiu a Segunda Guerra Mundial, o Itamaraty já havia baixado uma série de leis e circulares, dificultando a entrada, no Brasil, de pessoas de raça semítica.
Souza Dantas, apesar dessas proibições, decidiu agir de acordo com sua consciência, conseguindo passaportes e assinando pessoalmente os vistos.
Entre as cerca de 800 pessoas, 425 delas de origem judaica, que entraram no Brasil, graças a Dantas, algumas viriam a ter destaque na vida brasileira, como o ator e diretor teatral Ziembinski.
Em novembro de 1940, o Embaixador Dantas foi advertido pelo Itamaraty, pelas suas concessões. Ele continuou a expedir vistos, com datas retroativas, de forma a serem anteriores à instrução.
Em 1942, Dantas enfrentou a Gestapo. Ele e os demais membros da representação brasileira, em Vichy, na França, foram confinados, em condições precárias, por catorze meses.
Por sua ousadia, mesmo concluída a guerra, foi relegado ao ostracismo diplomático, pelo governo brasileiro.
Somente depois de dezembro de 1945, ele seria nomeado para chefiar a delegação brasileira na ONU.
Morreu pobre e abandonado, em um humilde quarto de hotel, em Paris, em 1954.
No ano de 2003, seu nome foi inscrito no Museu do Holocausto, em Jerusalém, como Justo entre as nações, por seu empenho pessoal na emissão de centenas de vistos, durante os anos mais duros da repressão nazista na Europa.
O homem que pôs em risco sua carreira e sua vida, que desafiou nazistas na Europa e políticos no Brasil, recebeu a medalha póstuma, por seus méritos.
Ele merece brilhar na galeria universal dos heróis do século vinte.

Redação do Momento Espírita, com base no livro Quixote nas trevas, de Fabio Koifman, ed. Record.
Em 30.03.2011.

segunda-feira, 28 de março de 2011

A melhor idade do amor

Sábado, dez horas e vinte e um minutos da manhã. Chuva insistente de outono. Um casal adentra uma panificadora para tomar café.
Dois cafés com leite e três pães de queijo, por favor.
Ela parece um pouco agitada. Não tira os olhos dele. Ele parece tranquilo, dessas pessoas que já conseguem viver num tempo um pouco mais lento do que o do relógio.
A diferença de idade é gritante. Não mais de quarenta, ela. Próximo aos oitenta, ele.
Ele olha para fora pela janela entreaberta.
Ela sorri, carinhosa.
Todos os seus filhos nasceram aqui nesta cidade?
Ele pensa um pouco... - Sim, todas elas... Três filhas.
E você? Onde nasceu? – Volta a inquirir a mulher.
Eu não sou daqui. Nasci no interior... Longe da cidade.
o que você lembra de lá?
Ah... Muitas coisas... – Responde ele, com leve sorriso.
Então, silencia. Parece fazer algum esforço para recordar de algo especial, mas logo desiste. Volta a olhar para fora, procurando a chuva fina.
Sabe... Acho que tive uma vida feliz...
Ela permanece interessada. Um interesse de primeiro encontro. Observa os cabelos brancos dele, a tez um pouco castigada, os olhos azuis.
Respira fundo. Alguém poderia dizer que é o respirar de quem está apaixonado.
Você só casou uma vez? – Pergunta ela, com certo embaraço na voz.
Sim. Tereza. Mãe de minhas meninas. Que Deus a tenha.
Ela fica um pouco emocionada e constrangida, repentinamente. Esboça um sorriso para disfarçar. Olha para a mesa. Ainda resta um pão.
Pode comer. Já estou satisfeita.
Almoçamos juntos amanhã? – Pergunta ele, ansioso por ouvir um sim.
Sim... Claro que sim. É dia de almoçarmos juntos. Você sabe que gosto muito de estar com você, de ouvir suas histórias...
Estou um pouco esquecido hoje, eu acho. Contei pouco...
Não tem problema. – Diz ela, carinhosa. - Tem dias que a gente está com a memória mais fraca mesmo.
Doutor Maurício disse que é importante ficar puxando as coisas da memória sempre. Ele diz que é como um exercício físico que fazemos para não “enferrujar”. – Conclui ele.
É verdade... – Ela suspira. – Precisamos cuidar da memória...
Novamente um longo silêncio entre os dois.
Ele volta a vislumbrar o exterior, contemplativo.
Ela nota seu rosto em detalhes, ternamente.
Fecha os olhos, por um instante, como se fizesse uma breve oração, uma rogativa sincera a uma Força Maior.
Volta a abri-los, vagarosamente, e então pergunta:
Pai... Pai... Posso pedir a conta?
Ele acena positivamente. A conta chega. Ela se levanta primeiro, vai em direção a ele, envolve-o num abraço e o ajuda a levantar.
Aquela era a rotina de todo sábado, às dez horas e vinte e um minutos da manhã, nos últimos dez meses.
*   *   *
Foram nossos genitores que nos proporcionaram um corpo, abençoado instrumento de trabalho para o nosso progressobem como um lar.
Pensando em tudo isso, louve aos seus paisCuide deles, agora quando estão velhos, alquebrados, frágeis ou doentes.
Faça o possível para não os atirar nos tristes quartinhos dos fundos da casa, aonde ninguém vai.Não se furte à alegria de apresentá-los aos seus amigos e às suas visitas;
Ouça o que eles tenham a dizerQuando estejam em condições para isso, leve-os para as refeições à mesa com você. Retribua, assim, uma parcela pequena do muito recebido por seus genitores anos atrás.

domingo, 27 de março de 2011

AÇÃO DA AMIZADE

A amizade é o sentimento que imanta as almas unas às outras, gerando alegria e bem-estar.
A amizade é suave expressão do ser humano que necessita intercambiar as forças da emoção sob os estímulos do entendimento fraternal.
Inspiradora de coragem e de abnegação, a amizade enfloresce as almas, abençoando-as com resistências para as lutas.
Há, no mundo moderno, muita falta de amizade!
O egoísmo afasta as pessoas e as isola.
A amizade as aproxima e irmana.
O medo agride as almas e infelicita.
A amizade apazigua e alegra os indivíduos.
A desconfiança desarmoniza as vidas e a amizade equilibra as mentes, dulcificando os corações.
Na área dos amores de profundidade, a presença da amizade é fundamental.
Ela nasce de uma expressão de simpatia, e firma-se com as raízes do afeto seguro, fincadas nas terras da alma.
Quando outras emoções se estiolam no vaivém dos choques, a amizade perdura, companheira devotada dos homens que se estimam.
Se a amizade fugisse da Terra, a vida espiritual dos seres se esfacelaria.
Ela é meiga e paciente, vigilante e ativa.
Discreta, apaga-se, para que brilhe aquele a quem se afeiçoa.
Sustenta na fraqueza e liberta nos momentos de dor.
A amizade é fácil de ser vitalizada.
Cultivá-la, constitui um dever de todo aquele que pensa e aspira, porquanto, ninguém logra êxito, se avança com aridez na alam ou indiferente ao elevo da sua fluidez.
Quando os impulsos sexuais do amor, nos nubentes, passam, a amizade fica.
Quando a desilusão apaga o fogo dos desejos nos grandes romances, se existe amizade, não se rompem os liames da união.
A amizade de Jesus pelos discípulos e pelas multidões dá-nos, até hoje, a dimensão do que é o amor na sua essência mais pura, demonstrando que ela é o passo inicial para essa conquista superior que é meta de todas as vidas e mandamento maior da Lei Divina.
Joanna de Ângelis